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Prostíbulo onde garotas estavam confinadas. Foto: Bruno Carachesti/Diário do Pará |
De acordo com o
delegado Rodrigo Spessato, que comandou a operação, as mulheres, de
idade entre 18 e 20 anos – além da jovem de 16, todas provenientes dos
estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul – eram confinadas
em pequenos quartos sem janelas e ventilação, com apenas uma cama de
casal, e havia cadeados do lado de fora das portas. Em depoimentos ao
delegado, as vítimas afirmaram que podiam ir à cidade de Altamira uma
vez por semana, por uma hora, mas eram vigiadas pelos funcionários da
boate.
Além da situação
de cárcere privado, a polícia encontrou no local um caderno onde eram
anotadas as dívidas das meninas, como gastos com passagens, alimentos e
vestimentas, além de "multas” por motivos diversos.
Ameaça de morte
Após a ação, a
policia civil resgatou, além da adolescente, quatro meninas e uma
travesti. Segundo Lucenilda, do Conselho Tutelar, as demais disseram ter
muito medo de retaliações, uma vez que o dono da boate teria ameaçado
seus familiares que moram no Sul. Em entrevista à reportagem, uma das
jovens resgatadas contou que, assim que a adolescente de 16 anos
conseguiu fugir, o gerente a seguiu com uma arma.
"Ele saiu atrás
dela armado e disse que não custava matar uma, que ninguém ficaria
sabendo”, afirma a garota, que tem 18 anos. Procedente de Joaçaba, no
interior de Santa Catarina, ela conta que lá trabalhava em uma boate
cuja cafetina era "sócia” do dono da boate no Pará. "Viemos em nove lá
de Joaçaba. Falaram para a gente que seria muito bom trabalhar em Belo
Monte, que a gente ganharia até R$ 14 mil por mês, mas quando chegamos
não era nada disso”, conta.
"Já de cara
fizemos uma dívida de R$ 13 mil por conta das passagens [valor cobrado
do grupo]. Aí temos que comprar roupas, cada vestido é quase R$ 200, e
tudo fica anotado no caderninho pra gente ir pagando a dívida. E tem
também a multa, qualquer coisa que a gente faz leva multa, que também
fica anotada no caderno. Depois de cada cliente, a gente dava o dinheiro
para o dono da boate pra pagar as nossas dívidas, eu nunca ganhei
nenhum dinheiro para mim”, explica a garota.
Sobre as
condições às quais foram submetidas na boate, ela conta que morava com
outras três meninas em um pequeno quarto muito quente, e que realmente
não tinha permissão de sair do local. "Eles ligavam o ar condicionado só
por uma hora. A gente tinha que trabalhar 24 horas por dia; quando
tinha cliente, tinha que atender”, afirma.
"De comida, tinha
almoço e janta. Se você estava trabalhando na hora do almoço, tinha que
esperar a janta. Se desse muita fome, a gente tinha que comprar um
lanche. O gerente da boate dizia que a gente só poderia sair depois de
pagar todas as dívidas, e que nem adiantava reclamar porque ninguém ia
nos ajudar, ele era amigo da justiça e nunca ninguém ia fazer nada
contra ele. Mas ele disse que se a gente falasse, eles iam atrás dos
nossos filhos e parentes lá no Sul.”
Belo Monte
Sobre os
clientes, ela conta que eram exclusivamente trabalhadores de Belo Monte.
"Eram operários, eram gerentes, tinha de tudo. Todo mundo que trabalha
na obra vinha na boate”, explicou.
O delegado
Rodrigo Spessato diz não saber se o prostíbulo está dentro ou fora dos
limites do canteiro de obras. A conselheira Lucenilda Lima relata, no
entanto, que para chegar à boate foi preciso atravessar o canteiro de
Pimental, um dos principais da usina. "Foi uma burocracia na entrada
para a gente conseguir passar. E lá mesmo toda hora passavam os carros e
tratores de Belo Monte, então eu considero que a boate está na área da
usina”.
Na ação, a
polícia civil efetuou a prisão de dois funcionários da boate, mas não
encontrou o proprietário. Segundo Spessato, além de exploração sexual de
menor, cárcere privado e regime de escravidão, o caso poderá ser
caracterizado como tráfico de pessoas, e os responsáveis pelo
prostíbulo, processados por estes crimes.
Como o canteiro
de Pimental fica no município de Vitória do Xingu, o caso está sendo
apurado pela delegacia dessa cidade. O delegado local chegou a Altamira
na manhã desta quinta-feira para tomar os depoimentos das vítimas e dos
dois funcionários presos, e voltará à boate ainda esta tarde em uma nova
ação para fechar o estabelecimento e resgatar 10 mulheres que
permaneceram no local*.
*Matéria atualizada às 15 h de quinta-feira, 14 de fevereiro, para inclusão de informações.
A matéria é da Repórter Brasil, por Verena Glass
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